VENTO
Está um vendaval impressionante. A botija de gás atrás da porta faz um esforço que não lhe compete para evitar que o vento entre pela garagem mesmo sem ser convidado.
A D. Celestina, vizinha aqui do lado, preparava-se para ir à padaria comprar as suas 3 carcaças, como de costume, quando foi surpreendida por uma rajada fugaz que a levou até ao fundo da rua. Foram dar com ela agarrada a um poste da electricidade, chorosa e descontente, impressionada por aquilo que lhe tinha acontecido, mas acima de tudo muito preocupada com a sua carteirinha que também tinha sido apanhada desprevenida, acabando por se esquivar das suas mãos. Continuam as buscas à carteira, porque sem ela as carcaças não saem da padaria e a D. Celestina não pode cumprir o seu ritual diário, de tanto desgosto em que se vê mergulhada.
Mas nem só histórias tristes conta o vento.
A Margarida, uma rapariga cá da terra, deve ter os seus trinta anos, saiu de casa como habitualmente, logo pela manhã. Dirigiu-se para o carro, com um casaco até aos pés e um lenço a tapar a cara, porque o tempo prega partidas e as poeiras fazem invasões constantes aos olhos mesmo de quem não as quer ver; e , no momento em que tirava a chave da sua carteira para que pudesse abrir a porta do seu Seat Ibiza e abrigar-se no interior, sente no rosto uma presença repentina. Descortina o lenço do olhar e encontra mesmo ao seu lado, a pairar, a boneca Bia que perdera em criança e que o vento se lembrara de lha trazer, para que pudesse recordar como feliz e descansada tinha sido a sua infância.
3 Comments:
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um dia também perdi um lenço no carro... trazia-o pendurado na janela do carro, por um nó, e fingia que era o meu cabelo, comprido, a viajar no vento. Iamos na calçada de Carriche quando o lenço se soltou. Além das lágrimas, também espero que um vendaval mo devolva. Gostei deste especialmente. Para não dizeres que não comento e que não pertenço às pessoas que comentam! :P nf
Muito obrigado pelo comentário. :-)
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